O homem pré histórico pintava animais nos interiores das cavernas com a certeza de que essas presas estariam sob o seu dominio quando fosse à caça. A Arte primitiva funcionava como um ritual para a sobrevivência, era uma espécie de "mágica" que se fazia antes do homem sair para caçar, e que lhe assegurava o sustendo diário. Depois que o homem deixou de ser nômade e passou a dominar a agricultura e criar rebanhos, percebeu que não precisava mais fazer os rituais de caça apreendendo-a através do desenho nas paredes da caverna; a partir daí houve uma mudaça estética crucial, o homem passa a pintar seu cotidiano, registrar os momentos corriqueiros como fazemos hoje quando fotografamos. A necessidade de contar historia, de construir memória é algo inerente ao ser humano e posso pensar que isso seja uma reminiscência do homem da caverna. Ainda que sejamos tão pragmáticos e evoluidos carregamos uma centelha dessa prática do encanto e da magia, que está na necessidade da construção das imagens e de conferir veracidade a esses registros. Quando revivemos momentos nostálgicos ao ver determinadas fotos, sentimos saudade de quem já se foi , ou nos emocionamos diante de uma cena de um filme, estamos praticando rituais imagéticos; quando rasgamos as fotografias de pessoas que nos feriram, quando um casal se separa e corta ao meio a fotografia separando assim também a imagem... há inumeras maneiras de ilustrar esse processo ritualístico. Tomamos como realidade mágica as meras imagens, embora tão evoluidos que parecemos ser, carregamos a magia dentro de nós , somos fascinados pela magia e por rituais.
Acender e apagar a luz ao pressionar um interruptor é uma mágica moderna, como também abrir e fechar os vidros do carro ao pressionar um botão , clicar com o mouse e ter acesso a múltiplas interfaces, conectar-se com o mundo através do computador, tomar café no Brasil e jantar em Nova Iorque, ler um anúncio que promete trazer a pessoa amada em 7 dias , emagrecer dormindo, se livrar dos sinais da velhice e etc, são alguns dos exemplos da mágica contemporânea. Assim como o homem primitivo era fascinado pela magia, também somos. Só que achamos a magia deles inferior e tola em relação à nossa porque estamos ha milhares de anos de seu tempo. A magia é tão corriqueira pra cada época que parece natural , assim também era para quem acreditava pintar o animal e este lhe tornaria submisso. Nossa realidade atual para um homem há 200 anos atrás seria no máximo ficção cientifica.
O homem demorou milhares de anos para desenvolver a escrita, para construir uma ferramenta específica, para concluir que era um ser animista. Hoje num espaço de vida de 80 anos, ou seja, na nossa curta vida, vivemos o que custou milhares de anos para acontecer. Aprendemos a ler e escrever aos 7 anos de vida e cada vez mais esse tempo vem sendo reduzido, hoje já se alfabetiza aos 6 e amanhã aos 5 já teremos crianças que leem; se aprende a segunda lingua aos 6 anos de idade e por aí vai... O homem está em evolução cognitiva e intelectual constante, ele cria a ferramentas e tecnologia, e essas o redefine e o desenvolve ainda mais potencialmente.
O homem primitivo achava que podia dominar a natureza desenhando o bizonte na caverna, de fato sentia esse poder, assim como uma criança que coloca uma capa de super homem acha que pode voar; essa é uma configuração mágica e inocente , mas que nunca se desprendeu do ser humano. Assim como o homem , seu sentido mágico tambem evolui.
Afirmou Freud que os opostos se tocam, a partir disso quero fazer uma analogia desse sentimento de poder, controle e de magia que tinha o homem da caverna com o homem mais moderno, aquele que cria a tecnologia e a domina. Esse ao criar a bomba atômica podia se sentir tão poderoso para dominar um território quanto o homem primitivo se sentiu ao dominar sua caça, ao saber que se ele disparasse essa bomba ela destruiria tudo como um passe de mágica.