A arte do século XX se constituiu de movimentos isolados por
grupos com diversas crenças sobre a realidade das artes; mas com um viés em
comum: romper com o passado. Na verdade, todo artista é de alguma forma “realista”,
no sentido de pretender mostrar em sua arte algum ponto da realidade. No caso
da Arte Moderna não se trata de um realismo estético, mas os artistas modernos
quiseram expressar uma realidade ideológica e filosófica, tentavam ser uma
espécie de profetas que denunciavam o mundo e sua condição.
Os artistas pré
modernos já buscavam um tipo a realidade estética, uma mimeses
técnica. Admitia-se a mentira – temas míticos- e a despretensão de
suas
obras em relação a denuncias em relação ao mundo. Eles se permitiam
criar alegorias, pois o que valia era a proximidade naturalista com a
qual representavam as figuras.
No modernismo, essa lógica inverte, o artista não mais quer o realismo
estético
em relação à natureza, e sim, ideológico, só que era uma ideologia
falaciosa e niilista.
A Arte Moderna, em sua maior parte, tem influencias anarquistas
e comunistas. É a arte das rupturas, mutiladora
das aparências naturais tal como a mutilação da ordem social e moral existentes
até então. O Construtivismo
era o movimento que tinha ligações diretas com o comunismo e que foi amadurecido
dentro desta ideologia. Para os comunistas russos do
inicio do século XX, a arte figurativa e temática estaria ligada a distração e
deleite da burguesia ociosa. Segundo os idealistas, se a arte não fosse utilitária
e comum, ela não serviria pra nada. A forma deveria servir a função, que por sua
vez deveria servir ao utilitarismo. Aniquila-se o prazer, a
criatividade e a virtude da apreciação; priva-se o homem de exercer uma função
que está circunscrita em sua estrutura. Esses ecos nos explicam porque a arte e a arquitetura
atuais são feias e insossas. A arte foi achatada e reduzida processos pragmáticos.
Pode-se observar tais intenções,
claramente, na citação de Vladimir Maikóvsky, que foi um poeta e teórico russo, autor do Manifesto Construtivista.
“Não avaliamos o nosso trabalho segundo o critério da
beleza, não o pensamos como o peso da ternura e dos sentimentos. Com o fio de
prumo na mão, com os olhos infalíveis dos dominadores, com um espírito exato
como um compasso, edificamos nossa época como o engenheiro constrói as pontes e
o matemático elabora as fórmulas das órbitas”.
Segundo a ideologia antiestética comunista, a arte
com fins utilitários demandaria a socialização da mesma , ou seja, todos deveriam usufruir da sua funcionalidade
e aprender sobre a ideologia marxista, pois ela tinha intenções
extremamente doutrinárias.As únicas formas concebíveis por este sistema
eram as formas geométricas mais simples, que remetem a racionalidade em
supressão aos sentimentos (simbolizados pelas formas orgânicas). Qualquer linha curva que sugerisse o mínimo deleite foi banida da Rússia no inicio do século
XX.
As bases construtoras da antiestética socialista absorveram os princípios da Teosofia. Wassilly Kandisnky, artista alemão
abstracionista, foi o primeiro a adaptar suas teorias estéticas dentro do campo
da Teosofia. Kasimir Malevich, artista russo, seguidor de Kandinsky
foi absorvido pelo governo russo para retratar a estética representativa da ideologia marxista, partindo de
sua obra Quadrado preto, onde o
artista atribui a esta forma e cor a supremacia geradora de todas
as outras formas. Segundo Malevich, o quadrado é a representação do intelecto,
porque é
uma forma totalmente concebida por ele e que não se encontra na
natureza, é a forma
onipotente geradora de todas as outras.
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Quadrado Preto, 1916, óleo sobre tela |
Essa base vai influenciar toda a
articulação comunista em relação a doutrinação, principalmente das crianças.
Abaixo, um livro
destinado as crianças na escola. Escrito em 1922, por EL LISSITZKY
O
livro basicamente conta a história de dois quadrados, um vermelho e um
preto, qual segundo a teoria de Malevich é a forma absoluta, geradora de
todas as outras - uma espécie de Deus. Eles chegam sobrevoando a terra,
que é representada por um circulo vermelho, e observam como a mesma está
desorganizada, a terceira página dá um zoom na desorganização (as formas se esbarrando e desalinhadas). Os quadrados
vermelho e preto descem para resolver o problema e estabelecer a ordem.
As formas, a medida em que se organizam em
cima do quadrado preto, tomam a cor avermelhada. O quadrado preto vai
embora e o vermelho repousa sobre a terra e todos vivem felizes para
sempre....
A arte também passaria a servir novas ostentações
do Estado. Vladimir Tatlin (1885 – 1953), arquiteto ucraniano, projetou um monumento dedicado a Terceira
Internacional (organização internacional fundada por Lênin em 1919, para reunir
os partidos comunistas de diferentes países). Assim era o projeto
de seu mega templo:
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Maquete da Torre. 1919 |
- Altura pretendida: 400 m.
- No interior da estrutura estariam suspensos sólidos geométricos, girando em velocidades constantes, contendo salas de reuniões, escritórios e no topo um centro de informações com um aparelho especial de projeção para lançar imagens nas nuvens, dentre boletins de noticias, proclamações governamentais e palavras de ordem revolucionárias seriam fornecidas diariamente para o povo.
A torre era uma estupenda
declaração de fé numa sociedade comunista!
Só que eles estavam há tantos séculos atrasados
tecnologicamente e industrialmente, que o projeto utópico não saiu do papel,
literalmente, pois virou estampa para selos russos.
Tudo girava a serviço do sistema comunista, apenas. Muitos
artistas soviéticos fugiram da Rússia por não poderem desenvolver seus trabalhos.
E ai de quem ousava fazer isso.... dá pra imaginar o que acontecia, não?
O cinema era outra forte ferramenta que foi apropriada
pelo sistema para produzir e reforçar sua doutrinação. Maiakóvsky reconhece o
cinema como arte construtivista ideal: Industrial, mecânica, anônima, ligada a
sociedade e ao mundo real, filmando as coisas existentes e destinado as massas
Cartazes produzidos por Alexander Rodchenko (1891 – 1956) para o cinema e a propaganda.
Eram apresentadas nas praças públicas peças teatrais encenando a revolução de 1917. As praças
eram decoradas com formas geométricas suprematistas.
Esse tipo de arte refletiu no Brasil na forma do
Concretismo. E até hoje sofremos as graves consequências desses ecos. Pois,
isso gerou uma arte cada vez mais pobre, abstrata e fragmentada. A maioria dos
artistas e arquitetos modernos eram comunistas, e foram os principais
formadores de opinião do século XX no Brasil e respondem até hoje de suas
catacumbas quando se infringe os dogmas do niilismo e da esquisitice. Tente ser
contemplado por leis de incentivos estatais com uma arte decente que logo escutará
os berros dessa gente ressentida.
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Franz Weismann 1960 |
Como todo sistema
ditatorial, o nosso atual governo não hesitou em encher os museus e
galerias publicas com arte ideológica
que trabalha a seu favor, que nega todo tipo de beleza e habilidade,
valores que
estão conectados ao modo de vida mais conservador. A arte hoje é, sem
dúvida, ideológica e trabalha para o governo. Isso fica bem claro através do outdoor que foi instalado na Bahia, que retrata um beijo gay, sendo que uma das figuras representa Jesus - e que por sinal é uma obra patrocinada por lei de incentivo governamental, aquele mesmo governo que
fala de “tolerância.”
O governo norte americano também tem patrocinado bizarrices cujo objetivo é destruir qualquer valor histórico, pior, cuspir neles e literalmente, mijar neles.
Andrés Serrano .‘Piss Christ’, imagem de Cristo na cruz submerso em um recipiente com a urina do artista.
O governo norte americano também tem patrocinado bizarrices cujo objetivo é destruir qualquer valor histórico, pior, cuspir neles e literalmente, mijar neles.
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O que a arte na
esfera publica representa é um grande medidor para a democracia, quando a arte
está homogênea, principalmente as artes patrocinadas pelo governo, há algo
muito errado acontecendo.
Desde os tempos mais remotos os ditadores utilizam arte a
seu serviço. Os imperadores romanos usaram os
retratos para a reafirmação do poder e de seu programa político. Foi a
estratégia utilizada por Augusto para
unificar Roma, que não usou a força, mas a persuasão pela imagem.
Podemos ler claramente na escultura que o imperador mandou produzir, de si mesmo, as seguintes inscrições:
• Autoridade.
• Imagem de um herói que iria trazer paz a Roma
– Pax Augusta.
• Gesto de estadista em comando.
• Descalço – signo de humildade.
• Relevos na armadura: Narrativa que
representava seu governo, de heroísmo, promoção de paz e aprovação dos deuses.
• Agrada todas as tendências políticas, imagem militar atraente.
• Pode-se ler: Augusto é atraente e não
ameaçador.
Resultado: uma ditadura que durou 400 anos.
O pior é que os ditadores geralmente são eleitos democraticamente; utilizam técnicas persuasivas para criar uma convicção em massa, que quando não é pela imagem é através do discurso. Monopolizam a criatividade para usar a seu favor e priva o povo da ação criativa, formando um bando de zumbis ideológicos.
Hitler também se valeu destes recursos para persuadir o povo,
atribuindo a sua imagem figuras de caráter religioso, especialmente da religião
judaico cristã. A imagem traz elementos messiânicos: sobre a sua cabeça a luz e a pomba, uma alusão a cena do batismo de Jesus.
A lógica é bem parecida neste quadro de Frida Kahlo, cujo título da obra é: “o marxismo dará saúde aos doentes” (1954).
Acima, do lado esquerdo, temos a figura de Marx degolando o malvado Tio Sam,
enquanto mãos miraculosas protegem Frida e lhe proporciona a cura, quando a mesma solta as muletas. Ela está segurando o livro vermelho, como um livro sagrado. Ao lado direito, acima, uma pomba branca da paz,
semelhante a pomba do Espírito Santo, sem contar o titulo da obra.
"A atribuição de funções messiânicas
ao materialismo dialético simbolizado pela figura de Marx, assim como a
identificação do mal com o “Tio Sam” exemplificam um padrão que se repete na
cultura secular, embora nem sempre de forma tão clara.Ou seja, a compreensão do
mundo contemporâneo passaria pelo rastreamento da funções divinas relocadas na
cultura secular, e pela compreensão da relação que o homem “secular” tem com os
objetos que absorveram essas funções" Guilherme de Carvalho
.
Todos os ditadores se posicionam como
os salvadores da humanidade, seja com imagens,
seja com discursos.
O que eu observo claramente é a semelhança que o sistema socialista tem
com as
religiões mais fundamentalistas e desprovidas de liberdade. A contradição é que o discurso do socialista é sempre vinculado a neutralidade
e é embasado numa ferrenha
denuncia das religiões históricas "opressoras". O que eles não entenderam
é que são
mais religiosos que os mais devotos, pois, não existe neutralidade.Se
eles produzem uma estética feia
e sem vida, lamentaremos! Pois por uma questão estrutural precisamos contemplar a beleza, que por sua vez já veio inscrita na natureza, e nós
artistas necessitamos reproduzi-las, pois estruturalmente somos
seres criativos. Precisamos de uma
crença genuína, precisamos de uma arte criteriosa e bem elaborada para
enxergar
a realidade, a arte não foi feita pra denunciar o sistema, tampouco para
servi-lo!
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